terça-feira, 15 de julho de 2008

Dos Grandes Clássicos Literários Que Não Li

Como Falar de Livros Que Não Lemos - Pierre Bayard

"Guia de sobrevivência nas rodas de bate-papo" - The New York Times
"Bayard ensina como fingir um orgasmo literário" - The observer
"Uma boa idéia, mas assaz afrancesada para o meu paladar britânico refinado" - Dr. Edward Pointsman, KBE

Bayard é um típico professor universitário francês. Nunca o vi e pouco sei sobre ele, mas tenho certeza que tem cabelos brancos desgrenhados, usa calças coloridas, camisas sociais amarrotadas (um mal da França) ou gola rolê (o maior mal de todos os tempos da França - em discussão para proibição na Convenção de Genebra) e uma terrível cara de bobo. Dirige (mal) um pequeno Renault e adora almoçar no Café Jade, ali por perto da Universidade de Paris, onde desdenha de tudo e todos junto a seus amigos: uma psicanalista que não faz sexo há 11 anos (e não por ter se decidido assim), um escritor de contos "brilhantes" que conseguiu ser traduzido na Romênia e ex-pastor que hoje dedica seu tempo ao estudo dos pássaros de Provence.

Bayard cresceu e vive em um ambiente de alta competição intelectual - talvez a única coisa em que a França seja competitiva - onde cada frase deve ser pontuada por uma referência cultural esquisita ou um deboche sutil aos americanos. Incapaz de competir com seus colegas professores na quantidade de livros lidos - dizem que era bom em beber vinhos mas um tanto preguiçoso na leitura - e cada vez mais oprimido pelo massacrante sistema de competitividade francês, Bayard resolveu que não aguntava mais aquilo e fez o que nos Estados Unidos seria o equivalente a entrar numa escola atirando em todo mundo: escreveu um livro confessando que não leu quase nada "que importa" em literatura, que é um preguiçoso, e tentando provar que não tem nada errado com isso - um manifesto ao "ignorante sim, e daí?".

Não li o livro do rapaz (não por preguiça, mas por ser chato mesmo) mas vou escrever a respeito.

Primeiro, parabenizar Bayard pela pela coragem em sair do terrível sistema francês de competição. Mais alguns meses e o sujeito se muda para Nova Iorque e se emprega num banco de investimentos - já posso vislumbrar no futuro um livro sobre como ninguém sabe nada de nada em mesas de operação dos bancos de investimento.

Ademais, ele faz uma categorização dos livros em: livros que não lemos, os que folheamos, aqueles dos quais ouvimos falar e os que esquecemos. Preguiçosa, como tudo no rapaz (dizem que ele pega o carro para ir comprar pão a dois quarteirões de casa e difilmente sai de Paris). Calvino, no seu brilhante Se Um Viajante Numa Noite de inverno fez uma descrição muito, mas muito melhor e detalhada no tema - e nem é preciso ler o livro do Calvino, tal descrição é o primeiro capítulo (ele já deve ter folheado o livro num dia menos preguiçoso).

De resto, deve ser um livro chato pra burro. Em primeiro lugar por ser francês contemporâneo. Em segundo lugar, porque o sujeito deve querer mostrar o tempo inteiro que na verdade ele é genial pra burro e não o colega de faculdade que leu Ulysses 38 vezes em 9 diferente línguas e 1 dialeto (algo que o C3PO faria muito melhor, diga-se de passagem) e passou os últimos anos o humilhando por ele não ter conseguido terminar O Arco íris da Gravidade. Em terceiro lugar, porque eu assim decidi.

Não li e não gostei, mas achei a idéia bacana.

Para mostrar que não sou de todo desprovido de razão, um trecho do livro:

"a não-leitura não é a ausência de leitura. Ela é uma ação verdadeira, que consiste em se organizar em relação à imensidão de livros, a fim de não se deixar submergir por eles. Por isso, ela merece ser defendida e até ensinada".

2 comentários:

Pedro Vieira disse...

Ih, eu ia comentar sobre a classificação de livros genial que o Calvino inventa no 'se um viajante...', mas vejo que você é um senhor bastante lido (ui!)

Ademais, concordaria plenamente com vossas observações, se não tivesse assistido à mesa com esse francês lá na Flip. O cara é divertido e inteligente, fiquei curioso pra ler esse bagulho aí.

Anyway, tb nunca consegui ler Ulysses inteiro. No máximo, o Dubliners hehhehe

Dr. Edward Pointsman disse...

Pois é, parece ser sim. Inclusive, no dia seguinte comprei o livro e parece realmente engraçado.

Mas, isso aqui não é pra críticas sérias. E eu terminei o Ulysses mas, confesso, foi por pura pirraça e orgulho, pra poder dizer "eu já li" - e quase tatuei isso, haha.